Dia do Aposentado: juiz tira dúvidas sobre o sistema previdenciário

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Para marcar a passagem do Dia do Aposentado, comemorado nesta terça (24), a Assessoria de Comunicação do TRT5 buscou orientações sobre o tema aposentadoria com o titular da 9ª Vara do Trabalho de Salvador, juiz Luciano Martinez Carreiro, que é mestre e doutor em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela Universidade de São Paulo (USP).

Além de magistrado, Martinez é professor de Direito do Trabalho e da Seguridade Social na Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde também coordena a Pós-Graduação em Direito do Trabalho. Autor de diversos livros, ele ainda assina uma coluna semanal sobre Direito Previdenciário no Jornal A Tarde.

 

 

Como o senhor avalia o conhecimento da população sobre a aposentadoria? A internet, por exemplo, está repleta de informações sobre previdência pública e privada, inclusive sites com orientações sobre recursos judiciais e benefícios. Até que ponto isso ajuda ou confunde o público? Qual a qualidade da informação? Há informação suficiente?
 
A internet, sem dúvidas, contribui para a difusão do conhecimento (por mais especializado que seja) e torna as pessoas mais conscientes dos seus direitos e deveres. Dois defeitos informativos, entretanto, teimam em produzir mais confusão do que esclarecimento.


O primeiro é o superficialismo, comportamento que faz com que as pessoas satisfaçam-se com o que ligeiramente leem, permitindo que elas saibam, como dizia uma música dos anos 80, "de quase tudo um pouco, e quase tudo mal"... O usuário da internet, a propósito, normalmente acredita que uma frase será suficiente para resolver o seu problema. Isso, entretanto, não é uma verdade, notadamente na área previdenciária, onde existem muitas exceções às regras e diversos pressupostos especialmente para conquistar a tão sonhada aposentadoria.


O segundo é o achismo, que é uma teorização fundada no subjetivismo do "eu acho que...". Agir de acordo com "achismos" dos internautas que, de boa ou má-fé, querem ser especialistas em tudo, é muito arriscado.


Diante disso, cabe a quem busca informações previdenciárias pela internet dar preferência aos sites públicos como, por exemplo, o www.previdenciasocial.gov.br, onde é possível encontrar respostas para quase todas as questões mais relevantes sobre aposentadoria, ou site privados que sejam de entidades ou pessoas bem conceituadas.
 


Empresas que cumprem obrigações trabalhistas costumam cumprir suas obrigações previdenciárias?
 
Nem sempre. É comum ver empresas que pagam salários e demais complementos salariais rigorosamente em dia, mas que não recolhem as contribuições previdenciárias decorrentes. Não há, portanto, uma relação necessária entre pagar salários e pagar tributos.
 

Houve um recorde de 23% na redução do déficit da Previdência. Que importância o senhor credita à Justiça do Trabalho nesse contexto? A ação do Judiciário tem sido didática para o mercado de trabalho?
 
Para responder essa pergunta é importante lembrar que ocorrerá "déficit previdenciário" quando  a União - que assegura o regime geral da previdência social - for chamada a cobrir eventuais insuficiências financeiras, comprometedoras do pagamento de benefícios de prestação continuada, como, por exemplo, aposentadorias, pensões, salários-maternidade e auxílios-doença. Isso acontecerá quando o montante arrecadado a título de contribuições previdenciárias não for o bastante para os referidos pagamentos. Assim, quanto maior for a arrecadação, maior será a quantidade de reservas disponíveis para a cobertura dos riscos sociais.


Deve-se registrar, ainda, que a previdência social funciona segundo um sistema contributivo intitulado de "repartição simples", que não possui reservas financeiras individualizadas. Significa dizer que o dinheiro que paga os inativos de hoje é exatamente aquele resultante da tributação dirigida aos segurados e tomadores de serviço de hoje. Para que tudo funcione bem é indispensável a existência de um delicado equilíbrio financeiro.


A Justiça do Trabalho, então, por ter a competência de executar não somente as dívidas trabalhistas, mas também as previdenciárias, acaba por ser garantidora desse equilíbrio e destacada alimentadora dos cofres previdenciários.
 


Assuntos como o fim do fator previdenciário, a desaposentação e a reforma da previdência do servidor público estão na pauta do Congresso Nacional e do STF. Por outro lado, o governo está sempre acenando para o "enxugamento da máquina" como forma de contornar crises econômicas. O senhor vê um cenário de perdas ou seria o caso de se falar em ajuste?
 
Ainda é possível falar em ajustes em nome do equilíbrio previdenciário.
Não há, entretanto, como fazer mágicas. Afinal, o que se arrecada com as contribuições previdenciárias precisa ser suficiente para pagar os benefícios ora existentes. Se houver desequilíbrio financeiro, deverá ser adotada uma das duas seguintes soluções: ou aumento das contribuições ou a restrição aos benefícios.


Sempre será traumática a tomada desta decisão, mas em algum momento ela pode vir a ser necessária, especialmente se considerarmos que a população brasileira tem envelhecido! Os economicamente ativos têm sido, então, cada dia mais solicitados a dar suporte financeiro aos benefícios pagos aos inativos, sendo certo que eles (os ativos) pedem em preces que, no futuro, quando também estejam aposentados, exista ainda uma população economicamente ativa capaz de arrimar os seus próprios benefícios em situação de solidariedade social.


Lutamos contra as perdas, mas, por vezes, progredir significa escolher entre os males o menor. Afinal, o que seria melhor: sofrer mudanças no sistema previdenciário ou vê-lo ruir?
 


E os reajustes dos benefícios? Pode haver mudanças nas formas de cálculo? Em que sentido?
 
Os benefícios previdenciários são garantidos contra a irredutibilidade nominal e real. Isso significa que, nos termos da Constituição, um aposentado não pode ter seu benefício nominalmente diminuído nem efetivamente comprimido pelas perdas inflacionárias. Nesse sentido, quando aumenta o salário mínimo, aumentam também as rendas mensais de aposentadoria.


Fala-se, é claro, em mudanças nas formas de cálculo do benefício inicial, mas ainda num plano meramente especulativo.
 


Quando a Justiça do Trabalho reconhece o vínculo de um trabalhador com uma empresa, a sentença não é garantia de que o INSS vai considerar o tempo de serviço para fins de aposentadoria. O reclamante deve recorrer a outro fórum? E quanto à execução previdenciária, já é pacífica a competência do Judiciário Trabalhista?
 
A lei (§ 3º do art. 55 da Lei 8.213/91), de fato, dispõe que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em "início" de prova material, isto é, em "vestígio" de prova documentalmente constatável, como, por exemplo, recibos de pagamento, termos de rescisão de contrato, avisos de férias, anotações em CTPS, etc., tudo analisado sob a perspectiva da autenticidade e da contemporaneidade.


Com essa exigência de prova material, o legislador quis, em verdade, impedir fraudes ou conluios. Para se ter uma ideia do que poderia ocorrer se não existisse essa exigência, imagine a situação hipotética de um segurado que, por precisar de cinco anos de tempo de serviço para conquistar a sua aposentadoria, ajuizasse uma ação contra uma empresa que faliu e afirmasse falsamente na petição inicial que para ela trabalhou. Diante da possível revelia da mencionada empresa falida, o juiz poderia - por boa-fé - estar prolatando uma decisão sem substrato numa realidade fática. Essa sentença, entretanto, não produzirá efeitos para fins previdenciários por conta da mencionada norma legal, que exige, em qualquer juízo ou tribunal, a apresentação de provas materiais. Ainda que ocorram recursos, a lei não poderá ser violada.


A lei, portanto, blinda o sistema previdenciário contra fraudes e, por isso, por vezes, acaba atingindo o que não é fraude, simplesmente por parecer ser...


A execução previdenciária na Justiça do Trabalho é uma realidade, sendo pacífica a jurisprudência em relação às verbas remuneratórias expressamente previstas nas sentenças condenatórias e nos acordos homologados.


Há, entretanto, indefinição - ver o disposto na Súmula 368 do TST e a redação do parágrafo único do art. 876 da CLT, quanto à possibilidade de alguém ajuizar uma ação no Judiciário trabalhista apenas para pedir o recolhimento das contribuições previdenciárias, reconhecendo o integral pagamento das verbas do contrato de emprego. 
 


 
Ascom TRT5 (com a colaboração do servidor Milton Fontes, do Serviço de Pessoal) - 24/01/2012

 

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