Oficiais de Justiça enfrentam as áreas de risco mapeadas pela polícia


 Foto do bairro de Nova Constituinte tirada por uma oficiala que prefere trabalhar em áreas populares porque as pessoas costumam ser educadas e atenciosas

 

 

Diferentemente de outros serviços públicos e privados que prestam serviços essenciais à população − como Correios, Embasa e Coelba −, os 15 oficiais de Justiça do TRT5 que atuam nas 13 áreas de Salvador mapeadas pelo Comando de Policiamento da Capital como as mais perigosas  − supostamente dominadas pelo tráfico de drogas − não mudaram a rotina de entrega de notificações nos últimos dois anos, e apenas o oficial que atua em Engomadeira foi duas vezes abordado com o intuito de o intimidarem.

 

¿As reclamações mais freqüentes são de assaltos e foram dos oficiais que cobrem bairros como Brotas, Costa Azul, Cidade Jardim e na Avenida Otávio Mangabeira, na orla¿, informa a diretora do Serviço de Distribuição de Mandados Judiciais, Avaliação e Depósito (SDMAD), Jaqueline Rocha, que coordena os trabalhos dos 76 oficiais de Justiça que atuam em Salvador e Lauro de Freitas.

 

Para trabalhar nas áreas de difícil acesso, os oficiais têm algumas estratégicas para se proteger − tanto fisicamente, como socialmente − e garantem que vão a lugares que os Correios alertam para ter cuidado ou que os carteiros nem vão. Uma oficiala que há quase dois anos cobre o subúrbio ferroviário conta que, mesmo com experiência em bairros populares, a rotina para atuar em áreas como Rio Sena, Nova Constituinte e Ilha Amarela precisou ser construída. ¿Em Pau da Lima, onde trabalhei antes, dava para entregar notificações até o início da noite, horário que a gente encontra as pessoas, pois estão retornando para casa¿, comenta a oficiala.

 

Já no subúrbio ferroviário o horário é restrito. Ela informa que aproveita o horário do comércio local, pois se sente mais segura, por isso só fica por lá até as 16h, e só trabalha até as 11h às quintas-feiras. ¿A partir desse horário o pessoal começa a beber, em ritmo de fim de semana, e aí fica perigoso mesmo¿. Tem mais: ela não vai de carro até as proximidades, anda de tênis, calça jeans surrada, cabelo preso, sem maquiagem, camisa branca bem composta e não leva crachá, celular nem bolsa.

 

Das 13 áreas consideradas de risco, trabalham nove mulheres e seis homens. As mulheres enfrentam o desafio sem reclamar e com muita coragem. Mas quem foi ameaçado mesmo foi um oficial, em Engomadeira. Para ele, a situação ficou tensa porque ele havia passado um dia pelo local e viu um grupo reunido em situação estranha. No dia seguinte vieram lhe indagar o que fazia ali. Ele informou que tinha um documento para entregar a determinado morador e ouviu deles que ali não tinha ninguém com esse nome. Para que o mandado fosse cumprido, a diligência foi feita pela oficiala que cobria a área anteriormente, até que os ânimos voltassem ao normal.

 

Sem polícia − Todos os oficiais de Salvador e Lauro de Freitas passam pelas áreas perigosas, pois há revezamento de dois em dois anos. Uma unanimidade entre eles é que em hipótese alguma devem aceitar a escolta da polícia para cumprir os mandados. ¿Na maioria dos casos preferem ir desacompanhados¿, informa Jaqueline. Chegar ao local acompanhado de policial pode marcar o oficial de Justiça e ele ter problemas quando retornar sozinho.

 

O oficial que foi ameaçado em Engomadeira conta que já lhe avisaram que em ¿toda esquina tem gente lhe olhando¿, naquela área. Certa oficiala também sente os ¿olheiros¿ em Rio Sena, local onde já avisaram para não entrar em determinada rua porque ¿lá é o boréu do Rio de Janeiro¿. Quando não dá para cumprir o mandado, o jeito é dar a certidão para que o juiz resolva o que será feito. Nesses locais muitas vezes não existe numeração nas casas, é preciso estar sempre de sapatos fechados por causa dos esgotos a céu aberto, e o nome da pessoa muitas vezes é desconhecido porque ela é chamada pelo apelido.

 

Apesar de tantas dificuldades, tem o lado humano, o contato com pessoas humildes que é gratificante. A oficiala que atua no Rio Sena garante que, em dezembro, quando haverá novo rodízio, ela quer outra área popular. ¿A maioria das pessoas é honesta, atenciosa, educada, basta a gente saber abordá-las com humildade¿, ensina. Ela conta que às vezes é até impossível listar qualquer bem para executar diante da carência de quem está sendo reclamado. ¿Mas é melhor que a arrogância de quem mora nos chamados bairros nobres¿, conclui ela.

 

Ascom TRT5 - 19/09/2008

 

Veja a matéria de jornal local que trata sobre as áreas de risco